domingo, 18 de fevereiro de 2024

O nevão

 O Algarve, devido à sua geologia, divide-se em três regiões principais: Serra, Barrocal e Litoral. Na serra por vezes neva, enquanto no Litoral e Barrocal é uma ocorrência muito rara.

Não me lembro de ver nevar na serra nos seis anos que lá vivi após o meu nascimento, mas recordo-me de uma vez (teria eu sete ou oito anos) ter caído um grande nevão no barrocal, aliás, nevou em todo o Algarve. É minha convicção que nunca mais nevou assim no Sul, embora o meu saber não chegue para poder garanti-lo.
Na altura, eu e a minha irmã, andávamos numa escola primária, que distava cerca de oito quilómetros da casa onde vivíamos numa herdade agrícola, distância que habitualmente tínhamos de percorrer a pé por caminhos rurais ou atravessando as culturas, pois demoraria muito se fossemos pela estrada.
Na manhã daquele dia, eu e a minha irmã, saímos cedo de casa para irmos para a escola, não lavamos a cara porque a água no cântaro estava congelada. Na rua estava tanto frio que dos beirais dos telhados pendiam pingentes de gelo e pelas nossas bocas e narizes saiam nuvens de vapor. Como eu andava descalço (como era comum andarem os rapazes pobres da minha idade), os meus dedos dos pés retraíam-se no contacto com o chão gelado. A água nas poças do caminho também congelara e, depois de pisadas pelos animais que já tinham saído para as lavouras, eram lâminas de gelo cortantes como pedaços de vidro. Quando tínhamos andado não mais de trezentos metros, eu, não suportando o frio e ferimentos nos pés, voltei para casa. A minha irmã seguiu, provavelmente por estar usando sapatos.
Pouco tempo depois, começou a cair obliquamente do céu, impelidas pela aragem que soprava do lado da serra, que ali ficava a norte, umas farripas brancas, que foram gradualmente vestindo de branco os telhados, o chão, as árvores e as sementeiras. Foi para mim uma novidade ver tudo coberto de neve como se fosse por um lençol branco e, na minha ignorância do tamanho do mundo, pensei que todo ele estaria assim.
Antes da hora do almoço, como a neve não parava de cair, a sineta da herdade foi tocada a dar ordem para que os animais fossem reconduzidos às manjedouras e as pessoas que trabalhavam no campo foram dispensadas para retornaram às suas casas.
Depois do almoço deixou de nevar, apenas soprava uma aragem fria, e a neve deu azo a brincadeiras na rua, havia alegria nas famílias dos assalariados e jornaleiros a agredirem-se com bolas de neve, mas preocupação nos meus pais. A minha irmã não regressara da escola na hora habitual.
Como a minha irmã estaria retida na escola impedida de regressar a casa se não a fossem lá buscar, o meu irmão, um moço voluntarioso com apenas dezasseis anos, sem medir os riscos pôs-se a caminho para a ir buscar, foi uma decisão verdadeiramente audaz e viril, pois ele não conhecia o caminho para a escola porque estava na herdade havia pouco tempo e nunca fora para as bandas onde se situava a escola.
Da porta da casa vi o meu bravo irmão desaparece a cortar caminho por entre as alfarrobeiras todas vestidas de branco. Entretanto a noite caiu e começou novamente a nevar e como tardava o regresso dos meus irmãos, eu e os meus pais, embrulhados em mantas incapazes de nos protegerem do frio, fomos para junto dos silos, no limite da aldeia, esperá-los, mais ninguém estava na rua, só nós três num mudo desespero como se alguma coisa muito má estivesse eminente. Preocupei-me também com os pardais, era nos telhados dos silos que eles se refugiavam ao fim do dia, estariam lá naquela noite, também eles tiritando de frio, mortos talvez, a neblina gélida não me deixava ver, mas supus que os telhados estariam cobertos de neve.
Como o meu irmão e a minha irmã tardavam em aparecer, o meu pai foi pedir ao fiel do armazém que tocasse a sineta para que eles, eventualmente perdidos algures no nevão, atinassem com o destino.
Naquela noite de singular frieza, o silêncio era absoluto na escuridão absoluta. Não se ouvia, mesmo que diáfano, o ramalhar das árvores, nem o latir dos cães, nem o piar distante de um mocho solitário. Quando a sineta começou a tinir, foi como se lanças me trespassassem a cada badalada. Curiosamente, a sineta era tocada diariamente quatro vezes a horas certas, para dar ordem de pegar ou largar o trabalho a todos os trabalhadores da herdade, pelo meu irmão, ajudante do fiel do armazém, o seu toque era distinto, enérgico e de cadência certa, o daquela noite refletia a idade avançada e cansaço do fiel, que para chegar à açoteia onde estava a sineta, teve que subir um lanço de escada de vinte e cinco degraus.
Permanecemos junto dos silos, de olhos pétreos fixos na bruma gelada banhada de mistério, procurando o mais ínfimo sinal, o que me pareceram ter sido muitas horas, não sei quantas de facto, mas sei que foram talvez as horas mais angustiantes da minha vida. A certa altura surgiu, emergindo vacilante da névoa um vulto vago e informe que não parecia ser gente, avançando num passo lento, tão lento que não dava para perceber se avançava ou se estava parado, depois mais nítido deu para perceber ser o meu irmão com a minha irmã sobre os ombros.
Finalmente salvos para contentamento de toda a aldeia, é que entretanto toda a gente tinha vindo para a rua procurando saber porque tangia a sineta demoradamente, algo jamais acontecido a semelhante hora, parecendo anunciar uma desgraça. Ademais, tocada pelo velho Vieira.
Já em casa, o meu irmão enquanto se aquecia no fogo aceso na lareira e comia umas sopas de café quente, contou-nos a sua aventura.
Ele chegara à escola já no lusco-fusco do fim da tarde e uma funcionária entregou-lhe a irmã. Puseram-se então a caminho, mas entretanto a noite caíra e toda a paisagem foi engolida pela escuridão e assim eles só podiam seguir guiados pela intuição, a ausência de estrelas no céu, os trilhos imperceptíveis sob a neve e um frio demoníaco, fazia ser imprevisível o seu destino. Como não parava de nevar, houve uma altura que eles abrigaram-se debaixo de uma árvore, mas quase foram atingidos por uma pernada que dela se desprendeu cedendo ao peso da neve, por isso reiniciaram a caminhada, tropeçando e caindo algumas vezes, mas sempre animados por uma indomável vontade de vencerem aquele demónio que lhes gelava o sangue e os ossos. A minha irmã, pequena e frágil, já desfalecia de frio e cansaço, por isso pararam outra vez sob outra árvore, mas o meu irmão, consciente de que se ali ficassem muito mais tempo, gelariam e seria o fim de ambos, apesar de também exausto, colocou a irmã às cavalitas e com reacendida coragem, continuou a rasgar a neve e a escuridão, na fé de o estar a fazer em direção à aldeia, mas não estava, quando começou a ouvir a sineta teve que corrigir o rumo. Só se consideraram salvos, quando avistaram as silhuetas dos três silos.
Nunca esqueci aquele nevão nem o episódio que foi, aos meus olhos de criança, uma heroica aventura vivida pelos meus irmãos.
Dino Conceição.
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sábado, 17 de fevereiro de 2024

Redfish

 São agora 04:30 da madrugada, estou levantado e sem sono. Já estive deitado, acho que dormi duas horas, acordei e não voltei a adormecer. Levantei-me e fui à cozinha colocar na panificadora automática os ingredientes para fazer um pão e, embora ainda não saiba o quê, vim para sala escrever.

Estou sentado, tenho à minha frente uma pequena mesa com o computador, é nele que escrevo.
São em noites como esta, de insónia e solidão que escrevo histórias sobre as minhas vivências pretéritas, mas agora não sei o que escrever. Se é a solidão que anima o génio, a mim hoje não produz esse efeito.
Encosto-me na cadeira para que o estado de descanso reactive o meu processo criativo. Fecho os olhos e puxo pela memória, mas apesar do esforço rememorativo não encontro uma recordação que justifique uma história. Acho que as minhas recordações vão-se apagando pouco a pouco sob o peso da idade.
Abro os olhos e percorro com o olhar a divisão da casa onde me encontro, a sala de estar, modestíssima com alguns móveis e objetos aos quais ganhei amizade. Sofá à direita, televisão desligada à esquerda e à frente a lareira com um relógio na prateleira da cornija parado por falta de corda, a mesa do computador acima citada e duas cadeiras, uma delas esta em que estou sentado.
Levanto-me, fecho a porta da sala para não ouvir o barulho da máquina a fazer o pão. Passeio pela sala, tento medi-la a passo, quatro por seis, se cada passo medir um metro, a sala terá vinte e quatro metros quadrados de área.
As quatro paredes oprimam-me. Abro a porta da sala e apago a luz, sento-me outra vez.
Sinto necessidade de me espreguiçar. Estou com sono, talvez agora adormeça. Desligo o computador, recosto-me na cadeira e fecho os olhos.
Não adormeci.
Ligo o computador, levanto-me e acendo a luz, dou corda ao relógio da lareira, acertando as horas pelo relógio do computador. Veio-me ao pensamento que o meu relógio biológico também precisa ser acertado. Eu não devia estar acordado a esta hora.
Volto a sentar-me para escrever este último pensamento, pouso os dedos sobre o teclado. Porém, antes de iniciar a escrita, olho para o chão e algo me arranca do solipsismo. Afinal não estou sozinho. Reparo que no chão está um bichinho quieto ao pé do meu pé direito, deve ser uma criatura inteligente, certamente que entre o correr para se esconder e o parar para passar despercebida, ilusoriamente protegida pelo seu mimetismo, do peso do pé que a pode esmagar, houve um rápido pensamento.
Poderei, num movimento miúdo, esmagar o mesquinho animal, mas pergunto-me, será a sua morte necessária ou justificável? Posso supô-lo assim quieto a querer fazer-me companhia. Esta hipótese, mesmo que fantasiosa e pueril, mais própria de um louco solitário, faz-me pensar que não o devo matar. Sou contra que se mate ou maltrate os animais, incluindo os bichos. Mesmo que por qualquer razão não gostemos de alguns bichos, devemos frear os instintos e acatar as razões da mãe Natureza. Claro que também tenho um lado mau, toda a gente tem. Não nego que sou bem capaz de matar um bicharoco se ele me for prejudicial, também existe em mim instinto de sobrevivência, mas agora abstenho-me de qualquer ação contra o animal.
Observo mais uma vez o pequeno ser que continua numa imobilidade absoluta, no qual todavia, palpitará um coração minúsculo pulsando de susto. Ocorre-me que geralmente não chamam-mos animais aos insetos e a outros bichinhos, mas na verdade é o que são. Também são criaturas de Deus.
Procuro na Internet saber algo sobre a criatura que imóvel no chão me faz companhia e fico a saber que é uma traça, um bicharoco que todos nós estamos sujeitos a encontrar nas nossas casas, é considerado um dos mais primitivos insetos conhecidos pelo homem, pois já existia no tempo dos dinossauros, o seu corpo cinzento com um aspecto prateado, fá-lo ser conhecido pela expressão inglesa «silverfish» (peixe de prata), esconde-se durante o dia em cantos escuros, alimentando-se de hidratos de carbono e celulose, pois possui um aparelho bucal mastigador que lhe permite comer papel e têxteis. Enfim! Uma praga com efeitos nefastos nos nossos bens, principalmente roupas e livros.
Na posse destas informações volto a olhar para o chão, para onde o bicharoco ainda devia estar, mas ele já se escondeu. Ainda bem para ele (é o meu lado bom que fala), porque agora estava decidido a matá-lo. Este pensamento não é bonito, não me orgulha. Mas claro, também existe em mim o desejo de proteger o que é meu.
No silêncio da sala sobressalta-me as pancadas lentas do relógio a dar as 8 horas da manhã e às narinas chega-me o aroma a pão acabado de fazer.
Está na hora de terminar esta prosa meio doida e ir fazer café.
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O baile

 

Bailes nunca foram a minha onda. Não sou dançarino, isto deve-se à minha personalidade introvertida. Na minha adolescência frequentei bailes, gostava de ouvir as músicas ao vivo e ver os pares rodopiando no salão, mas faltava-me coragem para convidar uma garota para dançar, mas num dos carnavais foi uma garota que me convidou.
Foi num baile de carnaval num clube recreativo, reparei nela assim que entrei no salão, ela dançava de um modo quase lascivo com um rapaz magricela com cara de fuinha. "Mal empregada para tal par", pensei. Fixei o olhar na face da linda criatura, os nossos olhares encontraram-se por uma fracção de segundo, e não mais despreguei os meus olhos dela.
Era uma garota curvilínea, de uma compleição sensual: Um rosto bem proporcionado, simétrico, por isso belo. Seios sumptuosos sugeridos por um decote ousado. Cintura marcada e ombros largos acentuados pelo decote da camisola que os deixava parcialmente nus. O cabelo negro e comprido, apanhado em topete, caía-lhe pelas costas como um rabo-de-cavalo. A saia de roda, de padrão colorido, passava-lhe menos de um palmo abaixo dos joelhos, como era moda naquela época, que então se chamava estilo «flausina».
Quando a olhava, como um predador a olhar a presa, dei por mim a pensar: “O que eu não daria para a ter assim nos meus braços”. Não poderia adivinhar que isso me custaria uma tablete de chocolate das mais caras à venda no bar do clube.
Quando a música terminou, ela foi sentar-se ao lado de uma senhora parecida com ela, sua mãe, supus. O escanifrado com quem dançava veio para os meus lados juntar-se aos amigos. No palco um sujeito anunciou ao microfone que a dança que se seguiria seria à inglesa, concluindo com um pedido: "As damas que façam o favor de irem buscar o seu par". Depois dos ajustes o conjunto sacou os primeiros acordes de uma nova música. Eu, com o olhar colado na «flausina» vi-a levantar-se e passar o olhar em volta de todo o círculo de rapazes que ansiavam por atrair a sua atenção, mas logo o desviou e cruzou-o com o meu. Olhou-me profundamente. Viu-me para além do que se vê. Só compreendi isto mais tarde. Tarde demais.
Um lento rubor subiu-me pelo pescoço às faces. Ela avançava direito a mim com um sorriso a pairar nos lábios. Eu, fazendo-me desentendido, desviei-me para lhe dar passagem, mas sem dela desviar os olhos. Porém, ela parou à minha frente pousando uma mão no meu ombro e sorrindo deu-me a outra para eu segurar. Eu disse para mim mesmo, o mesmo que dizia um dos versos da canção que se ouvia: "I just can't believe it's true", que mentalmente traduzi para português: "Não acredito que isto seja verdade".
Mas era verdade e era preciso agir, por isso tomei na minha mão a mão oferecida e com a outra enlacei-a pela cintura. Foi inebriado pela mistura de aromas quentes e doces que emanava do seu colo que ao ritmo da música fomos para o centro do salão onde fomos rodeados por vários outros casais .
Agora, com ela nos meus braços, pude confirmar como era bela e sensual. No seu colo perfumado que o decote panorâmico deixava ver, a pele parecia de seda chinesa e por duas vezes tive a tentação, que reprimi, de lhe tocar com os lábios. No entanto, não pude reprimir uma outra reação de uma parte do meu corpo que o pudor me impede de referir.
Certamente, o pau-de-virar-tripas, o tal lingrinhas com cara de fuinha, estaria de atalaia, não fosse a diva permitir o encosto dos corpos, mas mesmo eu dançando mal, a dança estava agradável, para mim, claro.
Quando a música ainda não ia ao meio, os músicos pausaram, exceto o da bateria que continuou a marcar o ritmo. Nos altifalantes ouviu-se o mesmo sujeito a ordenar: "Damas ao buffet".
Quando o baterista fez soar o último toque no címbalo, os outros pares desfizeram o enlaço e dirigiram-se para o bar, nós fizemos o mesmo. Era ali que ela me queria. Não abraçado a ela no meio do salão, mas ali. Tomei consciência disto quando chegamos ao balcão e ela apontou para as mais caras tabletes de chocolate (naquele tempo uma boa tablete de chocolate era muito cara). Afinal, não era ela a minha presa, mas eu a dela.
Não pedi nada para mim, receando não ter dinheiro suficiente para pagar a despesa. É que à entrada do baile parte do meu pecúlio ali ficara, pois naquele tempo as damas não pagavam a entrada e assim, eram os cavalheiros a suportar todos os custos.
Voltamos ao salão, o conjunto reiniciaram a canção suspensa e nós retomamos a dança com ela a empunhar o troféu, repito, uma das tabletes de chocolate mais caras existentes no bar do clube.
Querendo retirar algum dividendo do meu investimento perguntei-lhe, à laia de convite, se dançaríamos a música que se seguiria. Convite que ela recusou com um sorriso subtil e uma frase fatal: "Tenho pena, mas já estou comprometida".
Detestei aquela resposta, detestei a sua voz de contralto, quase masculina.
A música terminou, ela exibindo um sorriso triunfal e sacudindo a tablete à minha frente disse: "Obrigada pela tablete". Eu afivelei na cara uma expressão de zanga e ia mandá-la para certo lugar, mas a visão do recorte dos seus seios quando a camisola desceu alguns centímetros na zona do decote, fez que a frase que já me subia pela garganta se desfizesse numa discreta tossezinha. "Obrigado também eu, gostei de dançar contigo", disse-lhe como despedida. Ela deu-me um último sorriso e virou-me as costas agitando o rabo de cavalo e afastou-se levando com ela, além da tablete o seu perfume, que já não era quente e doce, porque os perfumes nos cheiram àquilo que sentimos, e o que eu sentia era frustação.
Momentos depois ainda a vi a dançar com o cara de fuinha, que vim a saber mais tarde ser o seu namorado.
Dino Conceição

Fui ver o mar

 Ontem esteve um lindo dia de sol, nem parecia Inverno. Depois do almoço, aproveitando o bom tempo dirigi-me para junto do mar. Ver o mar é uma coisa que gosto fazer quando me quero ausentar das minhas angustias e tristezas. Sobretudo se o mar estiver agitado. O impacto das ondas contra as rochas fascina-me, exerce em mim um efeito catártico e apaziguador.

Também gosto de reviver o passado, procuro-o muita vez, outras vezes é o passado que vem ao meu encontro e ontem algo transcendente me esperava. Uma lembrança tangível da minha adolescência.
Numa praça da povoação praiana havia uma feira de antiguidades e a curiosidade levou-me a deambular por entre as velharias. Numa das bancas estavam expostos discos antigos em vinil e os meus olhos fixaram-se numa capa, descorada pelo tempo e manuseamento, de um «single» (disco de vinil com uma só música em cada lado). Um pensamento percorreu-me o corpo como um choque eléctrico e fez-me juntar as mãos junto da boca. No reverso daquela capa estaria a dedicatória a mim dirigida pela minha primeira namorada e, num tropel de recordações, recuo cinquenta anos.
Éramos muito novos. Ela cantava em festas de casamentos, batizados e bailes populares organizados pelo pai dela, tinha uma linda voz e pose de cantora profissional. Um dia gravou um disco, que na altura fez muito sucesso, ouvia-se muito na telefonia, depois seguiram-se outros. Quando o primeiro foi lançado no mercado, enviou-me um exemplar pelo correio, com uma dedicatória na contracapa, "Para ti meu querido, desta miúda que te ama muito". Sem gira-discos onde o pudesse colocá-lo a girar, guardei-o, mas no rodopio da vida, acabei de o perder.
No início ela, quando andava em tournée, escrevia-me todas as semanas, a dar-me notícias da sua vida atribulada em festas e espetáculos por todo o país. Numa dessas cartas, a última que me escreveu, desejou-me sorte e felicidade, e no final, num "Post Scriptum", uma mensagem subliminar dava-me conta do fim do nosso namoro: "lamento muito meu querido, dizer-te isto, vou casar em breve". E assim acabou o nosso namoro.
Tive conhecimento do seu casamento, com um dos músicos que a acompanhava, por uma notícia na Crónica Feminina. Vi-a algumas vezes na televisão, mas ao vivo nunca mais. Não sei se ainda canta, há muito tempo que não sei dela, consequência de vivermos em mundos diferentes, e também porque me prometi nunca mais me encontrar com ela, mas agora, que os meus rancores do passado se esvaeceram, sinto saudade dela.
Ligeiramente dobrado e com o coração apertado fiquei por momentos a contemplar o pequeno envelope, de seguida peguei nele com o indicador e o polegar como quem pega numa flor e fiquei a olhar com atenção forense, deixando que o poder das recordações se apoderasse de mim, esforçando-me para ouvir a voz dela na minha memória, depois senti-lhe a superfície com a ponta do dedo. Passei os dedos pela fotografia do rosto dela, sentindo uma espantosa sensação de reencontro e, num gesto inconsciente levei-o ao nariz, por breves instantes pareceu-me sentir o cheiro dela e duas lágrimas assomaram aos meus olhos. Gostava do cheiro dela, um cheiro a fresco, a roupa lavada, a sabonete, a jasmim. Um dia disse-lhe: "Cheiras tão bem", e ela disse-me que era a jasmim. Ainda hoje o cheiro a jasmim está associado na minha memória ao cheiro dela.
Virei o invólucro na ilusão de encontrar a dedicatória a mim dirigida, no entanto a ilusão foi efémera. "Sou mesmo tonto", disse a mim mesmo. Aquele era apenas um outro disco dos milhares que foram editados.
Voltei a colocar o disco onde o tinha tirado, recuperei a postura, limpei os olhos, assoei-me, e dirigi-me para junto do mar.
Estava um dia bonito, o céu era de um azul único, denso, quase tangível. Soprando do mar uma aura salitrosa humedecia-me o rosto e o rumorejo dissonante da ondulação chegava-me aos ouvidos como uma melodia melancólica. Eu não me sentia bem, as recordações que o pequeno disco me sujeitou fizeram-me vítima de uma neurastenia inexplicável.
O mar estava um pouco agitado, estava maré cheia e as ondas rebentavam contras as pedras do esporão, projetando jactos de borrifos.
Levado por uma volição quase suicida fui sentar-me nas rochas, onde respingavam as ondas, entrando num torpor de uma espécie de autismo.
Não estou certo que estivesse consciente da passagem do tempo, pois ignoro quanto tempo que ali permaneci sentado, numa imobilidade de corpo e espírito, respirando os salitres do mar, diluindo nas águas os meus pensamentos. Já o sol se afundava no horizonte parecendo um navio a em chamas quando acordei do êxtase e saí do lugar. Fiz ali como que uma catarse, uma purificação emocional da minha alma.

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A PRIMEIRA VEZ

Aos dezoito anos eu era um jovem ingênuo, inexperiente no que respeita ao amor e ao sexo, mas, como é próprio da idade, com alto nível de testosterona. Nunca me tinha deitado com uma mulher e ansiava que isso viesse acontecer, ser virgem parecia-me ser pouco próprio para a minha idade. Mas no dia do meu décimo nono aniversário, tive a minha primeira vez com uma mulher (jovem, embora fosse cinco anos mais velha que eu) que se empregara na residencial onde eu estava hospedado em Lisboa. Chamava-se Márcia, eu tinha-a conhecido duas ou três semanas antes. Nesse dia eu chegara à pensão ao fim do dia e preparava-me para ir tomar um banho, mas ainda no corredor, uma das empregadas, uma minhota de palavrão fácil, ao passar por mim diz-me em tom confidencial: Há uma pessoa que te quer conhecer, inquiri, também em surdina, quem me queria conhecer, mas ela em voz alta, já a entrar na lavandaria, disparou: Despacha-te caralho, vais ficar preso pelo beicinho (escrevi uma palavra obscena, não é que eu goste deste tipo de linguagem, arrisco-me que me julguem mal educado, mas escrevi-a só porque quero ser o mais possível fiel aos acontecimentos e, como eu disse atrás, a empregada era minhota e no falar do Minho a dita palavra não soa a obscenidade). Dito daquela maneira, insinuando que era uma mulher que me queria conhecer, o caso adquiriu um cariz misterioso, quiçá até excitante.

Fui rápido a tratar da minha higiene, meia hora depois já eu estava à porta da lavandaria querendo saber quem me queria conhecer. A empregada minhota passava a ferro roupa de cama, mas nisto alguém me pediu licença para entrar e eu cedi-lhe passagem. Era uma mulher por mim desconhecida, a minhota disse-lhe: É este o moço. A desconhecida rodopiou e enfrentou-me, ficou tão perto de mim que não pude apreciar as suas formas. O rosto sim, de traços inconfundíveis do sangue africano. Pele morena, lábios afros realçados por um brilho lustroso, dentes muito brancos e bem alinhados. Cabelos negros ondulados, olhos grandes e brilhantes. A blusa de malha fina, justa ao corpo, enfatizava o volume dos seios. Enfim, uma mulher muito bonita vista de frente. As formas do seu corpo, verdadeiramente esculturais, só no dia seguinte, quando ela percorria o corredor, as pude apreciar, também era bonita vista por trás. Ela estava ciente e orgulhosa da beleza do seu corpo, pois quando dobrava a esquina do corredor e me surpreendeu a observá-la esboçou um sorriso e perguntou-me: Sou gostosa? Fiquei hirto como um criminoso apanhado em flagrante. Corei.
Bom! Voltando ao momento em que conheci a Márcia. Ela, ereta na minha frente, com o rosto perto do meu, disse, numa voz suave e xaroposa, que tinha muito gosto em me conhecer (havia uma modulação na sua voz que não identifiquei logo, fiquei a saber mais tarde que a modulação era o sotaque brasileiro) e encostou os lábios húmidos na minha bochecha. Uma mulher, que não era minha mãe nem minha irmã, dar-me um beijo, mesmo sendo um beijo instantâneo como a bicada de um pássaro, fez-me sentir de imediato o fluxo da adrenalina a fazer subir-me pelas veias até à cara uma corrente quente e o batimento do meu coração acelerou. Atrás, imóvel, a empregada minhota, observava a minha reação, mas eu, fascinado como um passarinho pela serpente, não dei um pio. Em certos momentos fico assim, acabrunhado, sem saber como agir ou o que dizer (eu era, e ainda sou, de rubor fácil, às vezes pergunto a mim mesmo porquê este comportamento tão embaraçoso). A sensação que começou a ganhar forma no meu subconsciente, obedeceu às leis inevitáveis do desejo, pois desenvolvi logo um fascínio erótico pela Márcia. A empregada minhota tinha razão, fiquei realmente preso pelo beicinho.
A recordação mais perene e recorrente, que tenho de quando conheci a Márcia é a do beijo na boca que ela me deu uns dias depois. Uma recordação juvenil, que tal como outras recordações juvenis, insiste em sobreviver ao meu envelhecimento. Foi na salinha do meu quarto, para onde ela sugeriu que fossemos. O meu quarto situava-se no rés-do-chão pertinho da lavandaria, era uma suite, além do quarto cama tinha uma salinha com um sofá, uma mesa e quatro cadeiras, como ficava pertinho da lavandaria era usada pelas empregadas, que em paga mantinham-me a quarto arrumado com esmero, o mesmo faziam com a minha roupa. Como eu rapazinho e o hospede mais antigo, era muito estimado, tanto pelas empregas como pela patroa. Digamos que eu era a mascote da residencial.
Quando nos sentamos à mesa frente a frente, ela disse: Queria tanto estar sozinha com você, eu, vencendo o encalhamento, perguntei-lhe, gaguejando as sílabas: Porque a senhora queria estar sozinha comigo? Ela roçou os meus lábios com os dedos e disse: Por favor, não me trate por senhora, trate-me por você como eu faço com você, e acrescentou: Queria estar sozinha com você para te conhecer melhor, acho lindo você ter a fotografia de Rita Pavoni junto da sua cama".
Isto requer uma explicação.
Naquele ano, a cantora italiana Rita Pavoni, de quem eu era fã, tinha vindo a Portugal e eu fui ver o seu concerto. No final do concerto recebi uma fotografia dela com dedicatória e autógrafo que, na falta de uma foto de namorada (porque namorada me faltava), coloquei emoldurada na mesinha junto da minha cama. Assim a baixinha sardenta era última coisa que eu via antes de adormecer e a primeira ao acordar.
A Márcia fez referência à fotografia de Rita Pavoni, pousando delicadamente a mão sobre a minha, acariciando-a. Eu, sentindo o rubor afoguear-me o rosto, retirei a mão como se me tivesse queimado, mas ela agarrou-a, e aprisionando-a na sua como se aprisionasse um passarinho, disse que me achava muito bonito. Era um cliché, mas um sentimento pueril de presunção encheu-me a alma. Foi nesse instante magnético que aconteceu o beijo. Por instinto tentei desviar a cara quando ela, segurando firmamento a minha mão, debruçou-se sobre a mesa e aproximou o seu rosto ao meu, fazendo-me sentir o calor do seu hálito, mas não consegui evitar que a sua boca chocasse com a minha. Não resisti, deixei-me levar pela volúpia do beijo. A sensação voluptuosa provocou-me uma imensa vontade de rir com que a contagiei, rimo-nos à gargalhada durante largos segundos. Ainda hoje tenho sensação da sua língua a entrar e rodopiar na minha boca, como a recordação mais doce da minha adolescência. Talvez eu, inexperiente nas questões sentimentais, tenha sucumbido com demasiada facilidade ao entorpecimento do espírito a que chamamos líbido, pois apaixonei-me pela Márcia.
A data do meu aniversário aproximava-se, coincidiria com o dia de folga da Márcia, então combinamos um jantar comemorativo num restaurante chic. Ainda recordo o seu sorriso malicioso quando disse: Sim, vamos jantar fora, depois será o que Deus quiser, não é meu bem? Uma frase que durante os dias imediatos se repetiria na minha cabeça como o refrão de uma canção ouvida ao despertar.
Tal como combináramos, no dia do meu aniversário jantamos num restaurante chic na baixa de Lisboa e no fim do jantar ela disse que tinha uma prenda para mim e disparou à queima roupa: Hoje vamos fazer amor! Com estas palavras mágicas, os portões prodigiosos para o paraíso abriram-se de par a par diante de mim. Você quer? Eu não respondi logo, não por me faltar resposta convicta, mas perante aquela proposta tão peremptória e decidida, achei que antes devia lhe fazer a confidência. Concentrei-me para não gaguejar (mas gaguejei). Não sei como me portarei, é que ainda sou... Foi ela que se encarregou de completar a frase: Virgem!?
Anuí com um breve maneio de cabeça e um sorriso. Revelar-lhe a minha virgindade tranquilizou-me, foi como se lhe pedisse condescendência, paciência e carinho. Ela franziu a testa por um segundo e depois os cantos da boca ergueram-se também num sorriso. Ficamos, tanto ela como eu, alguns segundos sorrindo em silêncio, como que a esperar que a palavra «virgem» assentasse. Depois ela debruçou-se sobre a mesa e aproximou a sua cara da minha, os seus lábios afloraram a minha orelha, não seja bobinho, disse, como se fosse um segredo, a tua virgindade é um trunfo, te faz extremamente sedutor, sorriu e acrescentou, serei muito carinhosa com você, e permaneceu a sorrir afetadamente à espera da minha resposta. O seu sorriso, e atitude afetuosa, ofereceram-me confiança e, com um sorriso reciproco, respondi: Então vamos fazer amor. Era a minha decisiva oportunidade.
No Rossio abeiramo-nos de um hotel, à porta estava um homem de uniforme, que sem nada lhe termos perguntado nos disse haver quartos vagos com muito conforto e asseio. Entramos, a recepção era num canto da sala do bar, dei o meu nome, paguei e recebi uma chave. Para mim a situação era tão nova, tão estranha que, num misto de vergonha e vaidade, senti-me alvo dos olhares das outras pessoas que estavam por perto, claro que ninguém olhou para nós, ou se olhou foi sem qualquer suspeição.
O hotel não tinha elevador e o quarto situava-se no terceiro piso. A Márcia procedeu-me e eu persegui-a num ímpeto que foi aquecendo a cada degrau até entrarmos no corredor e depois no quarto. Ela trancou a porta e abraçou-me, nossas bocas colaram-se, nossas línguas entraram num frenesim louco, ávidas de luxúria, permitindo-me saborear toda a volúpia que o beijo continha. Quando nos largamos ela, sem pingo de pudor, começou a despir-se, tão delicadamente como uma serpente a sair da sua própria pele e, virando-se de costas para mim, pediu para eu lhe desprender o sutiã, um sutiã vermelho maçã, tal como a outra peça que lhe tapava o sexo, (fi-lo com dificuldade por não saber como funcionava os colchetes de um sutiã), depois colocou-se completamente nua à minha frente. Eu, num êxtase supremo, subjugado pela visão do seu corpo nu, não consegui mover-me. Era a primeira vez na vida que experimentava o gozo de ver ao vivo uma mulher nua. Ela ficou quieta, deixando-me apreciar o seu corpo. Os meus olhos perscrutam cada pormenor do seu corpo, belo e carnudo de pele escura acetinada, seios túmidos, como os das mulheres cujas fotos eram publicadas nas revistas para adultos, proibidas na época. Impulsionado pelo Armageddon erótico que tinha lugar dentro da minha cabeça, desejei abraçá-la, acariciá-la, beijar o seu corpo, quis avançar para ela, mas, como num pesadelo, as pernas não me obedeceram. Tentei dizer que ela era linda, mas a emoção teceu-me uma teia na garganta e as palavras ficaram presas na armadilha. Ela permanecia quieta, a uma distância de dois ou três passos, com os olhos fixos em mim, húmidos, não sei se comovida pelo meu êxtase, se pelo meu pudor em lhe tocar.
Finalmente consegui falar: Você é tão bonita!, Ela fez um gesto teatral de modéstia e respondeu: Nesta figura? depois, fazendo uma pose irónica, colocando a mão na anca, e numa expressão de impaciente disse: Querido! Despe-te, e lentamente começou a despir-me. Comecei a sentir a minha vergonha a desvanecer-se e apressei-me a tirar os sapatos, as meias e as calças, mas deixei ficar as cuecas, foi ela que as puxou para baixo, e meu sexo, como que impelido por uma mola saltou, túrgido e pulsante. Ela afasta-se um pouco e abre os olhos histrionicamente, mordisca o lábio inferior, recua mais um pouco e queda-se a observar a minha virilidade. Era evidente que se apercebia da importância do momento, não só pelo prazer que ela própria tivesse, mas também pelo prazer que me proporcionaria.
Estranhamente senti-me confortável com a minha nudez exposta ao olhar da Márcia (acho que estar nu perante uma mulher é algo sensual e libertador, a mim faz-me sentir plenamente livre, não sei se isto também acontece com os outros homens). Ela abriu a cama e caiu nela pesadamente de costas, estendeu os braços para mim e, com um certo prazer no timbre vocal, disse: Vem amor! Sentindo-me como um passarinho na hora do seu primeiro voo, prestes a lançar-se no vazio, fui.
Passamos a noite sendo um do outro, como se espera de dois amantes, comungando momentos de pura intimidade. A Márcia, era cinco anos mais velha do que eu, e experiente na arte do prazer sexual, eu fui o seu aprendiz, mas, verdade seja dita, não sei se tecnicamente fiquei qualificado.
Aturdido de felicidade, extenuado e sonolento, adormeci. Acordei abraçado à Márcia, ela dormia. A claridade vaga da aurora entrava no quarto através do intervalo das cortinas, da rua chegava o bulício dos ruídos madrugadores da cidade.
A Márcia acordou quando a libertei do abraço, disse: Bom dia amor, e sentou-se direita ajeitando a almofada nas costas e eu imitei-a, ficamos largos minutos assim em silêncio, como se executássemos algum ritual.
Como poderíamos ficar no hotel até ao meio dia, ficamos conversando intimamente, intercalando a conversa com carícias. Até que ela disse quase num murmúrio que queria que o tempo parasse e ficássemos sempre assim, depois acrescentou qualquer coisa sobre orgasmo. A palavra orgasmo era-me desconhecida, um dia depois procurei-a num dicionário.

Tomávamos banho e voltávamos para a cama ainda com os corpos molhados e voltávamos ao "vai e vem" (será que existe uma forma poética para falar de praticas sexuais para que eu pareça menos pervertido?). As frases e palavras que ela empregava quando atingia o climax e o sotaque açucarado potenciava o meu desejo.
Aquele primeiro dia passou-se como um sonho, saímos do hotel, almoçamos num restaurante, divagamos pela cidade de mão dada ou abraçados, por vezes parando para mais um beijo.
A minha cabeça fervilhava de desejo, desejo de repetir os momentos de prazer induzidos pela Márcia, eu estava realmente apaixonado, queria-a como minha mulher. Sentia-me inteiramente feliz, de coração puro, obcecado pela ideia de, casado ou junto, ficar com a Marcia. Disse-lhe: vamos viver juntos? e ela disse que sim.
Vivemos juntos quase dois anos na residencial, no meu quarto e ela trabalhando lá.
O romance terminou quando ela, por um imperativo familiar regressou ao Brasil.
O tempo é implacável no seu curso, transcende as circunstâncias individuais. Com a distância e a passagem do tempo, perdi o meu primeiro amor.

Todas as reaç
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